Professor passa em 1º lugar em concurso da UFMG que ele mesmo elaborou a prova

Por: JEM  Data: 15/03/2023 às 15:20

A Justiça Federal suspendeu liminarmente, a pedido do Ministério Público Federal (MPF), o resultado de um concurso para professor adjunto do Departamento de Genética, Ecologia e Evolução do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

A ação se deu ao se constatar que o primeiro colocado do concurso era o chefe do Departamento de Biologia Geral da UFMG na época da elaboração da seleção e que ele agiu em todas as fases de formatação do processo seletivo do qual participou.

O procurador da República Adailton Ramos do Nascimento afirmou que a participação do professor numa seleção elaborada por ele próprio viola o dever de igualdade de condições exigível nas disputas por cargos públicos, além de outros princípios da administração pública, como moralidade, impessoalidade, legalidade e isonomia. Ele apontou ainda a possibilidade de fragilidade nos mecanismos de controle da UFMG.

“Sendo a moralidade administrativa um conceito amplo que inclui a integridade, a honestidade, a probidade e a imparcialidade, percebe-se com clareza cristalina que o professor agiu, deliberadamente, em flagrante conflito de interesses, prejudicando a imparcialidade e a lisura do processo de seleção”, argumentou o MPF na ação.

Por lei, é vedada a participação em licitação, direta ou indiretamente, de agente público do órgão licitante. Portanto, a participação do professor no concurso é nula e não pode produzir efeitos.

Vantagem sobre concorrentes
Segundo o MPF, o professor foi designado para a chefia do departamento em fevereiro de 2018. A partir daí, ele participou diretamente da definição dos critérios da vaga que seria ofertada em concurso, como a área de conhecimento, o perfil desejado do candidato e os quesitos para avaliação e atribuição de nota. Documentos assinados por ele comprovam a participação.

O edital do concurso foi publicado em agosto de 2019 e em novembro daquele mesmo ano o então chefe de departamento foi dispensado do cargo. Dias depois, ele se inscreveu no mesmo concurso. Em dezembro de 2022, o resultado homologado atribuiu ao professor o primeiro lugar.

O professor havia entrado também com pedido de aposentadoria e, assim, poderia acumular os salários de professor aposentado e professor adjunto.

Reconhecimento da nulidade do processo
A Justiça Federal reconheceu a aparente nulidade da seleção pública por violação, em especial, da impessoalidade, o que justificou a suspensão do processo seletivo. “Ao se constatar que o servidor apresenta interesses outros diversos do estritamente coletivo, verifica-se a ofensa ao interesse público. Apenas o desinteresse absoluto do servidor público tem nítido caráter impessoal. O ato administrativo não pode se eivar de subjetivismo, predileções e preferências pessoais”, diz trecho da decisão judicial.

A ação civil pública segue tramitando na Justiça Federal em Minas Gerais. Ainda cabe recurso da decisão liminar.

Em nota, a UFMG comentou o caso, afirmando que, assim que recebeu questionamentos do MPF, suspendeu o concurso e que colabora com as investigações. Veja:

“A Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) informa que, tão logo foi questionada pelo Ministério Público, suspendeu o concurso para professor adjunto do Departamento de Genética, Ecologia e Evolução do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) e pediu vistas do processo. A UFMG acolheu todos os encaminhamentos do Ministério Público e está colaborando com a apuração da denúncia. Como instituição pública a serviço da sociedade, a Universidade se pauta pela lisura de seus processos seletivos e envida esforços para que o caso seja devidamente esclarecido.”

A reportagem do Estado de Minas pediu do Departamento de Genética, Ecologia e Evolução do ICB mas não havia obtido respostas até a publicação da matéria. O espaço segue aberto para manifestação dos citados na reportagem.