O choque de preços dos alimentos, que já se reflete em índices de inflação, foi iniciado com a corrida aos supermercados antes do começo do isolamento.
Com aumento da demanda, o preço do ovo atingiu o maior valor desde o início da série histórica do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da USP, em 2013. O produto desponta como protagonista da alta nos preços dos alimentos após o início da pandemia de coronavírus.
O choque de preços dos alimentos, que já se reflete em índices de inflação, foi iniciado com a corrida aos supermercados antes do começo do isolamento e se mantém em um período de empobrecimento da dieta em famílias de baixa renda mais afetadas pela crise.
Proteína barata, de fácil preparo e durável, o ovo é usado por famílias de baixa renda como substituto de carnes mais caras. O cenário de alta retrata bem as mudanças de hábito do consumidor, que passou a realizar as refeições em domicílio após o isolamento.
Segundo os dados do Cepea, a caixa com 30 dúzias atingiu R$ 115,25 em São Paulo na semana passada, alta de 17% em apenas um mês. O movimento altista é percebido em todos os cinco polos pesquisados pelo instituto.
A consultora do Cepea Juliana Ferraz diz que a demanda neste período é normalmente aquecida, por causa da quaresma, período em que algumas famílias evitam o consumo de carne vermelha.
“Só que esse ano, essa alta foi ainda maior por conta da pandemia, que gera uma certa apreensão no consumidor”, conta ela. “Houve demanda muito grande nas duas últimas semanas e acabou refletindo na alta de preços.”
O consultor Carlos Cogo, da Cogo Inteligência em Agronegócios, lembra que o consumo já vinha crescendo no fim do ano passado devido ao aumento do preço da carne bovina, mas acelerou novamente este ano. Em 2019, o consumo foi de 230 ovos por habitante. No primeiro trimestre, em taxa anualizada, chegaria a 235.
Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o preço do ovo subiu 4,67% em março, o quinto maior aumento entre os itens de alimentação no mês, quando o IPCA foi pressionado pela alta de 1,13% nos preços dos alimentos e bebidas.
Levantamento feito na semana passada pelo economista da FGV (Fundação Getulio Vargas) André Braz com itens da cesta básica mostra que o ritmo de alta se intensificou no fim do mês, com alta de 9,04% apenas na última semana de março.
Foi um dos produtos de maior aumento, ao lado de tomate (13,34%), batata-inglesa (5,20%) e batata inglesa (5,20%). Para especialistas, o consumidor ainda verá novos aumentos nos preços dos alimentos, antes que a situação se normalize.
Mas a expectativa é que a demanda desaqueça com a perda de renda da população, que deve passar a priorizar compras de curto prazo. “Massa salarial caindo, desemprego informalidade, governo demora para reagir, isso tudo vai conter o preço dos alimentos”, diz Cogo.
No caso do ovo, porém, a expectativa é que os preços se mantenham em níveis altos durante um período maior. “O produtor não sinaliza interesse em ampliar a produção, porque ele sabe que é uma demanda pontual”, diz. “Sob a ótica da oferta, a gente não vai ver um aumento.”
Em nota, a ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal) afirma que o principal fator de alta no preço do ovo é o custo de produção em um cenário de elevados preços do milho e da soja no país. O crescimento da procura, diz, também é um fator de pressão.
“Apesar disto, é importante ressaltar que o ovo ainda é a proteína mais acessível ao consumidor das diversas classes sociais”, completa a entidade, concluindo que não há risco de desabastecimento e que a tendência é de equilíbrio na oferta de produtos nas próximas semanas.