Mais de 20 anos após crimes, pastores acusados de queimarem jovem vivo vão a júri popular na Bahia

Por: g1  Data: 26/04/2023 às 13:33

Dois pastores evangélicos acusados de assassinarem o adolescente Lucas Vargas Terra, no ano de 2001, serão julgados nesta terça-feira (25), em Salvador. O júri será realizado no Fórum Ruy Barbosa, e a previsão é de que será concluído na sexta-feira (28).

Depois disso, os dois réus colocaram o adolescente dentro de uma caixa de madeira e o queimaram vivo em um terreno baldio. Joel Miranda e Fernando Aparecido da Silva serão julgados pelos crimes de homicídio triplamente qualificado e ocultação de cadáver.

Os três agravantes para o homicídio são: o motivo torpe, o emprego do meio cruel e a impossibilidade de defesa da vítima. A defesa dos pastores disse, em nota, estar convicta da inocência deles, e que não há provas ou indícios contra os dois pastores, Joel Miranda e Fernando Aparecido.

O Ministério Público da Bahia (MP-BA) não informou se eles também irão a júri pelo abuso sexual. Além deles, um terceiro pastor, o Silvio Galiza, também foi acusado do crime, condenado e preso em 2007, mas teve pena reduzida e ganhou liberdade condicional, em 2012. Entenda ponto a ponto:

Réus neste júri:
Joel Miranda: na época do crime, Joel era pastor da Igreja Universal no Rio Vermelho – onde o estupro ocorreu. Após o crime, ele se mudou para o Rio de Janeiro, onde até 2022 comandava uma igreja.

Fernando Aparecido da Silva: em 2001, ele trabalhava no Templo da Pituba. Após o crime, ele passou a comandar uma igreja em Minas Gerais.

O crime:
O crime aconteceu no dia 21 de março de 2001, dentro de um templo da Igreja Universal do Reino de Deus, no bairro do Rio Vermelho.

Na época, o pai da vítima contou que o adolescente foi estuprado após ter flagrado os pastores Joel e Fernando tendo relações sexuais.

Depois disso, o adolescente foi colocado dentro de uma caixa de madeira e queimado vivo em um terreno baldio na Avenida Vasco da Gama, em Salvador, com ajuda do pastor Silvio.

Histórico:
O pastor Silvio Galiza foi o primeiro a ser identificado pela polícia, por participação no crime. Ele foi apontado como o principal autor da morte de Lucas Terra. Em 2004, ele foi condenado a 18 anos de prisão e cumpriu cerca de sete anos de regime fechado. Em 2012, ele ganhou liberdade condicional.

Em 2007, Silvio denunciou os pastores Joel Miranda e Fernando Aparecido da Silva por envolvimento no crime. Ele também confirmou que o flagrante da relação sexual entre Joel e Fernando foi a motivação do crime.

Em 2008, o pastor Fernando Aparecido da Silva chegou a ser preso, mas em poucos meses, passou a responder o processo em liberdade.

Em novembro de 2013, a Justiça inocentou Joel e Fernando. A família de Lucas recorreu e, em setembro de 2015, os desembargadores do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) decidiram, por unanimidade, que os religiosos fossem à júri popular, decisão confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Em abril de 2017, o STJ negou recurso especial para os acusados, que pediram a suspensão do júri popular.

Em 2018, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, anulou, por falta de provas, o processo que envolve a participação do bispo Fernando Aparecido da Silva na morte de Lucas.

Em novembro de 2020, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu que os pastores vão a júri popular.

Morte do pai de Lucas

Pai de Lucas Terra protestou em frente ao fórum de Salvador — Foto: Reprodução/ TV Bahia

José Carlos Terra, de 65 anos, pai de Lucas Vargas Terra, morreu em fevereiro de 2019, no Hospital Ernesto Simões, em Salvador. Ele estava internado na unidade e teve uma parada respiratória decorrente de uma cirrose hepática, diagnosticada um ano antes.

Na época, a mãe de Lucas – Marion Terra – disse que ele teve o estado de saúde agravado em novembro de 2019, após receber a notícia de que a decisão que indicou o envolvimento do bispo Fernando Aparecido da Silva na morte do filho havia sido anulada pelo Ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), por falta de provas.

Nota da Igreja Universal na íntegra
“A Igreja Universal do Reino de Deus esclarece que está completamente convicta quanto à inocência de Fernando Aparecido da Silva e Joel Miranda, que são Pastores da Universal, estando um em Minas Gerais, e o outro no Rio de Janeiro.

Quem conhece o trabalho da Igreja sabe que ela exige de todos os membros de seu corpo eclesiástico um comportamento irretocável, para que possam exercer a função missionária a eles confiada, como um verdadeiro exemplo de conduta para a comunidade onde atuam. Afastando, assim, qualquer um que tenha um comportamento contrário à fé cristã e do comportamento requerido de bispos e pastores. Contudo, em relação aos dois – ambos com quase 32 anos de ministério –, jamais foi encontrado, até aqui, comportamentos, provas ou indícios que os coloquem na cena deste crime tão brutal e lamentável.

Posto isto, a Universal reforça que continua acreditando na Justiça brasileira, e tem a convicção de que será restabelecida a justa decisão à época da Juíza de 1ª instância, de não os levarem a júri popular, por absoluta ausência de provas contra os mesmos.

Nossas orações – pelos familiares da vítima –, e pelos pastores, que, juntamente de seus familiares, têm sido submetidos a uma grave, descabida e injusta pena, em uma campanha midiática que já dura há anos. Os Bispos, pastores e milhões de simpatizantes da Universal que estão entre as maiores vítimas de preconceito religioso no Brasil, sentem também essa dor”.