Decisão do STF sobre Simples Nacional não afeta operações posteriores a 2008

Por: Conjur  Data: 15/09/2020 às 09:46

Em julgamento virtual realizado no dia 4 de agosto do Tema 1050 da repercussão geral reconhecida no RE 1.199.021, decidiu o plenário do STF por unanimidade pela constitucionalidade do parágrafo único [1] do artigo 2º da Lei nº 10.147/2000, dispositivo que veda aos contribuintes optantes pelo Simples o benefício da alíquota zero pelo regime monofásico do PIS/Cofins.

Embora o citado dispositivo tenha agora sido declarado constitucional, o que poderia restringir a aplicação do sistema monofásico aos contribuintes do Simples Nacional, tal decisão em nada implicará na sistemática atual aos citados contribuintes.

Isso porque o mandado de segurança que deu origem ao processo em questão foi impetrado anteriormente ao advento da LC 128/08, que mudou a sistemática e deu autorização legal aos contribuintes do Simples Nacional a usufruírem do citado benefício.

O dispositivo declarado constitucional foi editado sob a vigência do sistema chamado de Simples Federal, instituído pela Lei nº 9.317, de 5 de dezembro de 1996, e revogado pelo artigo 89 da Lei Complementar nº 123/06, que instituiu o Simples Nacional, sistema atual.

Na redação original da Lei Complementar nº 123/06, não havia disposição específica quanto a tributação das receitas provenientes da venda de produtos sujeitos à tributação concentrada (monofásicos) e, de fato, inexistia amparo legal para a segregação de receitas ou alteração dos percentuais relativos ao PIS e a Cofins.

Contudo, a partir das alterações promovidas pela Lei Complementar nº 128, de 19 de dezembro de 2008 (legislação posterior ao processo em questão), em especial a nova redação que seu artigo 3º atribuiu ao artigo 18, §4º, inciso IV e §12 da Lei Complementar nº 123, de 2006, o Simples Nacional passou a admitir a segregação e redução do valor a ser recolhido, senão vejamos:

“Artigo 18 (…) — §4º. O contribuinte deverá considerar, destacadamente, para fim de pagamento: (…) IV – as receitas decorrentes da venda de mercadorias sujeitas a substituição tributária e tributação concentrada em uma única etapa (monofásica), bem como, em relação ao ICMS, antecipação tributária com encerramento de tributação” (cf. red. do artigo 3º da LC 128, de 2008).

Destaque-se que essa alteração só entrou em vigor em 1º de janeiro de 2009, conforme artigo 14, inciso II, da Lei Complementar nº 128, de 2008 e hoje seu teor é dado pelo artigo 18, §4º-A, introduzida pela Lei Complementar nº 147, de 7 de agosto de 2014.

Nessa senda, o tratamento tributário das receitas de vendas de mercadorias sujeitas à tributação concentrada ao PIS/Cofins, pelos contribuintes do Simples Nacional, também veio a ser disciplinado nos §§6º e 7º do artigo 25-A da Resolução CGSN nº 94, de 29 de novembro de 2011. E hoje é disciplinado pelos §§6º e 7º do artigo 25 da Resolução CGSN nº 140, de 22 de maio de 2018, nos seguintes termos:

“Artigo 25  (…)

§6º. A ME ou EPP que proceda à importação, à industrialização ou à comercialização de produto sujeito à tributação concentrada ou à substituição tributária para efeitos de incidência da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins deve segregar a receita decorrente de sua venda e indicar a existência de tributação concentrada ou substituição tributária para as referidas contribuições, de forma que serão desconsiderados, no cálculo do valor devido no âmbito do Simples Nacional, os percentuais a elas correspondentes. (Lei Complementar nº 123, de 2006, artigo 2º, inciso I e § 6º; artigo 18, § 4º-A, inciso I, § 12).

§7º. Na hipótese prevista no § 6º: I – a incidência da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins deverá ocorrer com observância do disposto na legislação específica da União, na forma estabelecida pela RFB; (Lei Complementar nº 123, de 2006, artigo 2º, inciso I e § 6º; artigo 18, § 4º-A, inciso I)”.

Cumpre destacar, ainda, pronunciamentos da Receita Federal do Brasil, feitos através de soluções de consulta, em que não resta dúvida da validade do entendimento aqui mencionado, são alguns exemplos: Solução de Consulta nº 173 — Cosit, de 25 de junho de 2014; Solução de Consulta nº 202 — Cosit, de 11 de julho de 2014; Solução de Consulta nº 111 — Cosit, de 8 de maio de 2015; Solução de Consulta Disit/SRRF09 Nº 9019, de 21 de julho de 2015; Solução de Consulta Disit/SRRF10 Nº 10028, de 04 de dezembro de 2015; Solução de Consulta Disit/SRRF01 nº 1006, de 05 de fevereiro de 2016; Solução de Consulta nº 19 — Cosit, de 1 de março de 2016; Solução de Consulta nº 225 — Cosit, de 12 de maio de 2017; Solução de Consulta Disit/SRRF04 nº 4037, de 26 de setembro de 2019, entre outros.

Dessa forma, embora a decisão do plenário do STF tenha declarado a constitucionalidade do artigo 2º da Lei nº 10.147/2000 para restringir o benefício da alíquota zero aos contribuintes do Simples Nacional, seus efeitos somente terão validade até 31/12/2008. Pois, com o início da vigência da Lei Complementar 128/08, em 1º/1/2009, nova sistemática passou a valer. Sistemática essa não contemplada, e nem poderia, no citado julgamento.

Note-se que na decisão fica assentado a posição do Supremo Tribunal Federal no sentido de que não cabe ao Judiciário, mas, sim, ao legislador infraconstitucional a faculdade ao dispor sobre tema que afete o tratamento favorável às empresas do Simples Nacional, podendo estender benefício fiscal ou deixar de fazê-lo. E é exatamente o que o fez com a edição da Lei Complementar 128/08, posterior ao processo em questão.


[1] “Artigo 2º – São reduzidas a zero as alíquotas da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins incidentes sobre a receita bruta decorrente da venda dos produtos tributados na forma do inciso I do artigo 1o, pelas pessoas jurídicas não enquadradas na condição de industrial ou de importador.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica às pessoas jurídicas optantes pelo Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte – Simples”.