Desde o último dia 17 de março, quando foi publicado o primeiro decreto estadual que elencou as medidas para o enfrentamento do novo coronavírus, entre as quais está o isolamento social, o Hospital Geral do Estado (HGE) já atendeu 1.081 vítimas de acidentes de trânsito. Quantitativo que tem preocupado as equipes médicas, pois o descumprimento da medida governamental tem levado muitas pessoas às ruas, resultando no aumento do número de colisões, atropelamentos e quedas de moto e bicicleta, além de contribuir para o crescimento da disseminação da Covid-19.
Nesses 70 dias já foram notificados 487 acidentes de moto, 394 colisões, 86 atropelamentos, 75 acidentes de bicicleta e 39 capotamentos. Uma média de aproximadamente 15 acidentes por dia. É válido recordar que esses números são apenas os registrados pela maior unidade de urgência e emergência de Alagoas, ou seja, eles crescem se forem considerados os quantitativos notificados em outros hospitais, sejam eles públicos ou privados.
“O que também nos leva a suspeitar de que as pessoas ainda não estão respeitando o decreto do Governo de Alagoas como deveriam. Ainda não estão evitando sair de casa; ou quando saem, provavelmente não tem se atentado a diminuir a velocidade do veículo e a observar melhor a movimentação nas ruas, pois mesmo aparentemente vazias, podem apresentar uma falha inesperada”, analisou o cirurgião geral do HGE, Álvaro Bulhões.
Constatação – No dia 16 de maio, em plena recomendação exaustiva para o isolamento social, duas adolescentes foram admitidas na Área Vermelha Trauma do HGE após se ferirem gravemente em um capotamento no bairro Benedito Bentes, em Maceió. Por serem menores de idade, elas não serão identificadas, mas, o fato teve repercussão na imprensa local, uma vez que, dos cinco atendidos pela unidade hospitalar, somente dois são maiores de idade.
“Mas tinham oito ocupantes no carro. Minha filha e eu estávamos cumprindo o isolamento em casa. Como já haviam passado muitos dias, ela me suplicou para ir assistir uma Live na casa da amiga, que fica na Jatiúca. Eu acabei deixando, porque entendi que era uma família do bem, também estavam respeitando o decreto e ninguém estava doente. O que eu não contava é que elas planejavam ir para outro lugar, ainda mais tão distante e desconhecido”, relatou a mãe de uma das menores, Daniela Cavalcante.
De acordo com a mãe, as adolescentes pediram um transporte por aplicativo com destino ao Eustáquio Gomes, onde supostamente haveria uma festa de despedida da colega da escola. No fim, acordaram voltar todos em um mesmo carro, dividindo os custos, desde que o percurso cortasse a Usina Cachoeira do Meirim, no Benedito Bentes. Assim foi feito, sete jovens entraram no carro de um recém-conhecido da festa, que superlotado fez com que alguns passageiros ocupassem até o porta-malas.
“Minha filha não se lembra de muita coisa. Somente que, após a usina, ele disparou pela estrada. A recordação seguinte, segundo ela, é dela se arrastando no asfalto e do motorista, que está foragido, chamando o guincho. A polícia está à frente da investigação. A outra menor, que está internada na mesma enfermaria, também conheceu na festa. Os outros estão todos em casa”, informou Daniela Cavalcante.
A filha de Daniela sofreu fratura exposta no tornozelo direito e lesão de partes moles no pé direito. Já a outra menor sofreu politraumatismo, com perda de substância nos membros inferiores. Essa última segue com seções de desbridamento. Ambos os quadros de saúde são considerados estáveis e seguem assistidas pela equipe multidisciplinar da Área Verde do HGE.
“Mesmo não estando em um espaço com casos suspeitos do novo coronavírus, todos sabemos que hoje o vírus pode estar em qualquer lugar: ruas, lojas, objetos e em pessoas, mesmo assintomáticas. Então, para mim, tem sido uma preocupação grande, estamos nos expondo mais ao risco de contaminação, mesmo percebendo que todos que cuidam da minha filha estão tendo muito zelo para evitar o contágio”, partilhou a mãe, que agora precisa sair de casa para estar com a filha no hospital.
Para o cirurgião geral do HGE, Álvaro Bulhões, infelizmente ainda falta muita consciência nas pessoas para a prevenção de acidentes, e os jovens continuam sendo a parcela mais inconsequente no trânsito. “Uso de celular durante a direção, consumo de bebidas alcoólicas antes de dirigir, desatenção nas vias, não utilização de equipamentos de proteção, velocidade acima da permitida, excesso de passageiros e outros desrespeitos às normas do trânsito. Todas são posturas evitáveis, mas, que resultam no aumento de pacientes nos hospitais, tudo o que não queremos, principalmente agora”, reforçou.