Em 14 anos, quase 100 mil pessoas foram vítimas do trânsito em estradas administradas pelo governo federal no Brasil.
Dados da Polícia Rodoviária Federal compilados pela CNT (Confederação Nacional dos Transportes) mostram que, de 2007 (primeiro ano da série histórica) até 2020, 99.365 pessoas morreram nas rodovias federais do país.
Em 2020, foram 5.287 mortes nas estradas federais. Esse número voltou a cair após crescer no primeiro ano do governo Jair Bolsonaro, quando o presidente determinou o fim da fiscalização por radares dessas rodovias. Hoje, a fiscalização por radares é permitida, desde que eles estejam visíveis, no caso de estruturas fixas, e que as autoridades publiquem em seus sites trechos que podem ser fiscalizados, no caso de radares móveis.
O total de acidentes também caiu em 2020 e ficou em 63.447 no ano passado.
A redução do fluxo de veículos nas estradas no primeiro semestre, no começo da quarentena, contra o novo coronavírus, ajuda a explicar essa queda, segundo Bruno Batista, diretor-executivo da CNT.
Sem dados consolidados do país, uma boa medida da queda no fluxo nas estradas é o monitoramento da ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias), diz ele.
A associação aponta uma redução da movimentação nas estradas pedagiadas entre janeiro e novembro (último dado disponível) do ano passado de 13% na comparação com o mesmo período do ano anterior. “Com menos veículos circulando, é natural que caia o número de acidentes”, afirma Batista.
Ocorre que o número de mortes não cai na mesma proporção do total de acidentes, o que indica que esses episódios ficaram mais graves, segundo Batista.
Há dois elementos que podem explicar o agravamento, que vem dos últimos anos, afirma ele.
O primeiro é a qualidade da infraestrutura das rodovias, antigas, com muitos trechos sem acostamento, com problemas de sinalização e na maior parte em pistas simples e de mão dupla -esse último fator explica o fato de que a maioria dos acidentes ocorre em colisões entre veículos (59% do total). Essas estradas não têm qualidade para acomodar a frota terrestre que mais que dobrou nos últimos 12 anos, diz Batista.
O segundo ponto é o problema na formação dos condutores e a falta de campanhas educativas para reduzir acidentes, que foram praticamente abandonadas, segundo o diretor da CNT. “O condutor precisa ser lembrado dos problemas da alta velocidade, falta de manutenção de veículos. Não basta fazer campanhas só na semana do trânsito, precisa ser no ano todo”, diz.
O governo tem recursos específicos para essas campanhas no Funset (Fundo Nacional de Segurança e Educação de Trânsito), formado por 5% do valor das multas arrecadadas. Esse fundo, no entanto, é sistematicamente retido, diz Batista, e dos R$ 750 milhões que o fundo tinha em 2020, 88% foi contingenciado.
O levantamento da CNT mostra que os acidentes e mortes nas estradas federais no ano passado tiveram um impacto de R$ 10,2 bilhões na economia do país. Essa soma é feita a partir de uma fórmula do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) que leva em conta os danos materiais nos veículos e nas rodovias, a perda de capacidade produtiva de acidentados e mortos e os gastos com o sistema de saúde, entre outros fatores.
Os fins de semana são os dias mais perigosos nas estradas federais. Os números mostram que 34% dos acidentes e 40% das mortes ocorreram aos sábados e domingos. Homens ocupam a maior parcela das mortes (82%). Além disso, a maior parte dos mortos são ocupantes de automóveis (43%) e motos (30%).
Os dados levantados pela CNT incluem somente rodovias federais porque o Brasil não tem um órgão que reúna de forma unificada dados de acidentes em todo o país. As malhas rodoviárias estaduais e municipais no país somam uma extensão mais de duas vezes maior que a das rodovias federais.
A redução de acidentes e mortes em 2020 se deu em países do mundo todo, como consequência da diminuição da circulação de veículos.
Em todo o estado de São Paulo, por exemplo, considerando pistas federais, estaduais e municipais, houve 5.023 mortes no trânsito, segundo dados do governo, menor número desde 2015. Só na capital paulista, segundo números do governo, foram 765 mortes, também o menor da série histórica, equivalente a 68% do registrado cinco anos antes.