Novas variantes do coronavírus continuam a surgir e causar preocupação pelo seu alto potencial de transmissão. Agora, já são seis as chamadas variantes de preocupação conhecidas, ou VOCs, sigla utilizada para descrever formas do vírus com mutações que podem causar estrago do ponto de vista de saúde pública.
Isto porque, embora seja normal e até esperado que os vírus sofram mutações, algumas delas facilitam a entrada do vírus nas células ou então impedem a ação de anticorpos neutralizantes.
As variantes do vírus são a B.1.1.7, identificada no Reino Unido, a B.1.351, que surgiu na África do Sul, as duas linhagens brasileiras, P.1, originária de Manaus mas já presente em 17 estados, e P.2, ainda pouco conhecida, mas encontrada no Rio de Janeiro e em alguns estados do Norte e do Nordeste. Nos Estados Unidos, foram identificadas a CAL.20C, do sul da Califórnia e, agora, uma nova variante de Nova York, chamada B.1.526.
Recém-descoberta, a cepa nova-iorquina foi identificada por dois grupos de cientistas distintos, um do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) e outro da Universidade de Columbia.
A preocupação é, agora, com o fato de a variante nova-iorquina estar crescendo em número no estado e por apresentar uma mutação que pode enfraquecer o potencial de proteção das vacinas.
Os pesquisadores da Caltech (Instituto de Tecnologia da Califórnia) encontraram a B.1.526 após fazer uma varredura em uma base de dados genômicos do coronavírus virtual e, a partir de centenas de milhares de sequências, encontrarem um padrão recorrente naquelas vindas de Nova York e região.
“Era um grupo de isolados [nome dado ao vírus isolado e reconhecido como diferente dentro daquela espécie viral] concentrado em Nova York que não tínhamos visto antes”, disse Anthony West, um bioinformático de Caltech, ao jornal The New York Times.
West e seus colegas acharam duas formas do vírus: uma com a mutação E484K e outra com uma mutação até então inédita (S477N), que altera a forma de ligação do vírus às células.
As duas versões fazem parte da mesma linhagem, a B.1.526 e, até meados de fevereiro, cerca de 27% das sequências nova-iorquinas na base de dados analisada eram desse clado.
Já a equipe da Universidade de Columbia sequenciou 1.142 amostras de pacientes hospitalizados em um centro médico nova-iorquino e identificou a presença da variante com a mutação E484K em 12% das amostras.
Como o estudo da Caltech analisou sequências isoladas, e não amostras coletadas de pacientes, ainda é cedo para dizer se a frequência encontrada pelos pesquisadores representa a atual taxa de circulação do vírus. Ainda assim, o avanço de uma variante que escapa da proteção dada por anticorpos neutralizantes, mesmo aqueles produzidos após a vacinação, causa preocupação.
Como Nova York foi uma das cidades americanas mais fortemente afetadas no início da pandemia, considerava-se que a soroprevalência na região, isto é, a parcela de pessoas que entraram em contato com o vírus e possuem anticorpos no sangue era elevada.
O mesmo padrão foi observado também na África do Sul e em Manaus: áreas com índice de contaminação elevado no começo da pandemia e que, imaginava-se, tinham adquirido a chamada imunidade coletiva, acabaram sendo palco para o surgimento de variantes que conseguem fugir da proteção dada por anticorpos neutralizantes.
O aparecimento da mutação E484K em pelo menos cinco das seis variantes de preocupação indica os caminhos escolhidos pelo vírus para se adaptar e prevalecer na população.
Esse fenômeno, chamado convergência evolutiva, ocorre quando uma mutação, por garantir vantagem adaptativa, surge diversas vezes em linhagens que não têm parentesco entre si.
Em um estudo publicado na plataforma medRxiv na forma de pré-print (ou seja, ainda não revisado nem publicado em revista científica) no último dia 18, pesquisadores do Hospital Geral de Massachusetts, em Boston, do Instituto Max Planck, Berlim (Alemanha) e do Instituto de Pesquisa em Saúde da África, em Durban (África do Sul) testaram o soro de vacinados com as vacinas da Moderna e Pfizer/BioNTech contra as variantes existentes do Sars-CoV-2.
O que os cientistas observaram foi que, diante da variante britânica, o soro imunizado não teve uma queda tão expressiva de anticorpos neutralizantes. Mas, quando colocado à prova contra as variantes P.1 e P.2, a queda na taxa de anticorpos foi grande, num valor muito maior para a variante sul-africana.
É importante destacar que os testes foram feitos com pseudovírus, isto é, réplicas artificiais do vírus em laboratório, e não com as variantes verdadeiras em circulação.
Embora seja um estudo pequeno (48 amostras de sangue) e com diversas limitações, o estudo indica algum grau de proteção das vacinas contra as linhagens P.1 e P.2.
No Brasil, as vacinas da Moderna e da Pfizer não estão sendo aplicadas na população, mas as vacinas Oxford/AstraZeneca e Coronavac já estão sendo estudadas contra a variante P.1. Até o momento, estudos chineses testaram a Coronavac contra as variantes britânica e sul-africana com resultados preliminares interessantes, mas esses dados ainda não foram divulgados. O Instituto Butantan está realizando pesquisa de eficácia da Coronavac contra a variante P.1.
Já a vacina Oxford/AstraZeneca teve bom desempenho contra a variante britânica, mas um estudo preliminar contra a variante sul-africana mostrou ausência de proteção.