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Anabolizante para mulheres vira fetiche nas redes sociais e médicos soam alerta

Shutterstock

“Para comprar Oxandrolona chama no direct do insta”, diz a biografia da “tiktoker fit”, cujos primeiros três vídeos são seus próprios testemunhos sobre as supostas maravilhas do esteroide anabolizante para chegar ao estilo “marombeira”.

Apenas no Tiktok, a influencer acumula 40 mil curtidas e, só nos vídeos fixados, 418,7 mil visualizações, além de 52,2 mil seguidores no Instagram.

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Estudante de direito, ela é apenas um entre muitos os diversos perfis na rede que promovem o uso do anabolizante oxandrolona para fins estéticos. O público-alvo, ao contrário da maioria dos esteroides do tipo, são mulheres.

O uso para tal finalidade representa um desvio significativo de sua função original, uma vez que se trata de medicamento para tratar pacientes com perda muscular crítica ou crônica, como idosos, casos de desnutrição, câncer, Aids e queimaduras graves.

A oxandrolona é um derivado sintético hormonal, ou seja, um esteroide anabolizante artificial que se liga ao receptor da testosterona e tem efeitos semelhantes ao deste hormônio masculino virilizante. Pode causar, no caso de mulheres, mudanças físicas como engrossamento da voz (que pode ser irreversível), aumento do clitóris, atrofia mamária, queda de cabelo, acne e risco de malformações fetais. É possível que desencadeie depressão, agressividade e irritabilidade.

O endocrinologista e médico do esporte Clayton Luiz Dornelles Macedo, presidente do Departamento de Endocrinologia do Exercício da Sbem (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia), diz que a população vem sendo iludida e exposta de forma preocupante.

Macedo, que também é coordenador do Núcleo de Endocrinologia do Exercício e do Ambulatório de Endocrinologia do Exercício da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), afirma que não existem estudos de boa qualidade ética ou científica que preconizem o uso de oxandrolona para fins estéticos.

“As doses usadas com esse objetivo são bem mais altas que as usadas clinicamente e o discurso enganoso de menos efeitos colaterais coloca os usuários em risco”, aponta Macedo.

A lista de efeitos colaterais inclui também, para homens e mulheres, trombose, embolia, aumento do colesterol ruim (LDL), diminuição do colesterol bom (HDL), hipertensão, alteração da glicose, aumento do risco de infarto do miocárdio, rabdomiólise (destruição e inflamação aguda dos músculos), infertilidade, derrame cerebral, arritmia e morte súbita.

A SBEM condena, por todos os riscos citados, o uso da oxandrolona com objetivo estético e declarou ainda, por meio de seu porta-voz, que os efeitos colaterais do uso de anabolizante são subdiagnosticados e subnotificados, sendo sua distribuição ligada a rotas como a do tráfico de armas e de narcóticos.

“Existe atualmente uma normalização, banalização e permissividade para o uso dessas drogas, [mas] não existe dose segura nem da oxandrolona nem de nenhum outro esteroide anabolizante para quem não possui deficiência hormonal”, diz Macedo.

Patrícia Corradi, médica endocrinologista da equipe de Medicina do Esporte da Rede Materdei de Saúde, concorda. “A hipertrofia causada pela oxandrolona consegue melhorar um quadro de desnutrição grave, que pode acontecer em doenças consumptivas, mas a indicação dela para fins estéticos é completamente banida pelas sociedades que regulam esse acompanhamento. O benefício não justifica o risco”, aponta Corradi.

Em 2018, a nutricionista e influenciadora Natalia Bravo Penariol começou a fazer Crossfit e, no decorrer das aulas, percebeu que precisaria de ajuda médica para melhorar seu desempenho e ganhar massa magra. Ela havia se tornado mãe há pouco tempo e emagrecido com a amamentação, o que a deixou insatisfeita com seu próprio corpo, que já era considerado magro.

Para atingir seus objetivos começou a usar oxandrolona, que foi prescrita por um endocrinologista.

“O médico me indicou uma dosagem baixa e logo no primeiro mês já senti diferença: uma maior resistência aos treinos e comecei a ganhar massa magra”, afirma Penariol.

Quando começou a competir, incluiu outro anabolizante, a boldenona. “Acabei ganhando nesse período 14 kg de massa magra e continuei com a oxandrolona. Em dosagem baixa não tem tanta virilização, [mas] eu tive aumento de clítoris, minha voz engrossou bastante e, depois do meu primeiro ciclo, quando parei, tive alopécia. Meu cabelo caiu, minha pele também estourou bastante, mais por conta da boldenona”, afirma a influenciadora.

Em 2020, ela suspendeu o uso em decorrência da pandemia, mas já retomou e está alternando o medicamento até hoje com outras substâncias.

Penariol afirma que é necessário ter disciplina nos treinos, além de conhecer os efeitos adversos. “Treino absurdamente, sigo planilha, faço dieta. Quando não fiz, até contei pros meus seguidores, engordei com uso de anabolizantes. Ele aumenta muito o seu metabolismo, te deixa mais agitada, mais acelerada, então você acaba tendo fome”, reforça.

Atualmente, ela recorre ao esteróide com a finalidade de manutenção. “Não tem nada que você faça que não vá ter os colaterais. Recebo muita gente se inspirando no meu corpo e até pacientes no consultório dizendo ‘nossa, quero um corpo igual ao seu’. Não vou gerar frustração ou vender algo que não existe. Falo: a densidade corporal que tenho é fisiologicamente impossível para uma mulher ter naturalmente”, destaca.

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