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Raqueline da Silva Santos

Francisco de Oliveira e sua contribuição para o Nordeste

COMPARTILHE Whatsapp Facebook Twitter Data: 10/01/2021
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Quem foi Francisco de Oliveira (Chico de Oliveira)?

Sociólogo, Nordestino, Pernambucano, recifense, nascido em 1933 e falecido em 2019. Conhecido por seu trabalho na Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste e por sua vasta contribuição sobre o Brasil, em especial, o Nordeste.

Foi professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH – USP), foi preso na ditadura militar em 1964, recebeu o prêmio Jabuti “na categoria Ciências Humanas, pelo livro Crítica à razão dualista/O ornitorrinco, publicado pela editora Boitempo” (EDITORA BOITEMPO [S/D]).

Com uma visão política de esquerda contribuiu com a fundação do Partido dos Trabalhadores, o qual saiu em 2013 por divergências ao mandato de Lula e posteriormente se filiou ao Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).

Com uma visão bastante crítica sobre as condições políticas, sociais, econômicas do país, o sociólogo estava além de seu tempo, e com isso foi ganhando papel de destaque no seu trabalho, inicialmente no Banco do Nordeste, e posteriormente sendo um braço direito de Celso Furtado na SUDENE.

Para Oliveira, a SUDENE foi uma grande experiência de trabalho. E a SUDENE foi um campo de batalhas para ele, uma vez que, foi a partir da superintendência que ele junto com Furtado, buscavam repensar a estrutura econômica do Nordeste a partir de novas proposições de planejamento, o que se sabe que não foi fácil, uma vez que, enfrentavam as estruturas de poder locais, principalmente a burguesia açucareira.

Chico é um autor que merece destaque na leitura sobre o desenvolvimento regional, pois por meio de seus escritos podemos compreender as diferenças regionais do Brasil, as condições de desenvolvimento, os conflitos de classes, as forças do capital que se estabelecem nas relações de produção e determinam os rumos das regiões.

Uma leitura que todo(a) nordestino(a) deveria fazer é a obra Elegia para uma re(li)gião: SUDENE, Nordeste, Planejamento e conflito de classes. Essa obra de tamanha relevância nos ajuda a compreender como se distribui as relações entre a região Nordeste e o Centro-Sul dentro da dinâmica de produção do capital.

Com esse livro Chico de Oliveira nos ajuda a compreender que há um profundo debate de subordinação ao mercado internacional, ou seja, o Brasil em sua dinâmica regional historicamente pode ser analisado por várias relações: capital x trabalho x região x mercado interno x mercado internacional. A questão regional no Brasil pode ser identificada por conflitos de classes e consequentemente os processos de subordinação e exploração de uma região para com outra, como é o caso do Nordeste para o Centro-Sul.

“O velho Nordeste e o novo Nordeste” (OLIVEIRA, 1981) precisa ser repensado a partir de políticas de desenvolvimento interno, não mais pensado para alimentar o capital estrangeiro ou o capital do Centro-Sul, é preciso que o Nordeste sai da condição de submissão e amplie suas condições de produção a partir do capital fixo e do capital variável, não servindo desta forma, apenas como mão-de-obra barata seja em seu próprio território ou em territórios do Centro-Sul. O Nordeste tem potencial para se desenvolver sem submeter-se às relações de subordinação do capital.

A OBRA:ELEGIA PARA UMA RE(LI)GIÃO

Esta Elegia não canta o amor do Nordeste passado, que foi o domínio dos latifundiários e dos “barões” do açúcar, Nordeste esse que se projeta agora num folclore que é, sob muitos aspectos, a glorificação de um passado de servidão. Esta Elegia canta o amor do futuro. Não esquece, porém, que, ao cantar, esse futuro realiza-se pelo aprofundamento da exploração, nesse futuro imediato. (OLIVEIRA,1981, p.17)

Oliveira começa relatando que a obra é fruto de uma paixão, ou seja, pelo seu carinho com o Nordeste, os camponeses, os trabalhadores, operários e dedica boa parte do trabalho a Orieta, sua companheira. Contudo, neste trabalho Chico de Oliveira transborda uma experiência escrita por meio das suas vivências cotidianas dentro e fora do território nordestino contribui para compreender a realidade desta região e a explica por meio da construção da SUDENE e os desafios vivenciados no enfrentamento de classes, seja no Nordeste ou no Centro-Sul.

Pensar o Nordeste e o Brasil a partir da perspectiva de Chico, transcende uma análise tradicional, ou seja, de ver o Nordeste sempre na condição de desigualdade em relação ao Centro-Sul do país, para Chico, essas desigualdades regionais cabe uma análise profunda e é a partir das relações do “processo de acumulação do capital e da homogeneização do espaço capitalista no Brasil” (OLIVEIRA, 1981, p.25) que podemos compreender as forças do capital internacional no controle dos modelos de desenvolvimento no território brasileiro, bem como a força da burguesia nacional dentro das regiões do país.

O Nordeste se estabelece como centro de exploração da economia internacional desde seu processo de colonização, esse Nordeste não cresce para si e sim para aumentar o processo de circulação e reprodução do capital dos europeus, todavia, à medida que se consolida a expansão da monocultura canavieira e a centralização do Nordeste dentro da economia nacional não se estabelece uma relação de desenvolvimento social e econômico dentro da própria região, uma vez que, o capital está sendo controlado por forças internacionais.

Com a decadência da monocultura canavieira e a expansão do café no Brasil, a burguesia nordestina vai perdendo espaço para os donos do café na região Centro-Sul do país, estabelecendo disparidades entre as regiões, o que “polariza e expressa as contradições da expansão capitalista no Brasil pelo exame dos diferenciais da acumulação global em todo o país” (OLIVEIRA, 1981, p.25), ou seja, as regiões passam a ser controladas por setores mais hegemônicos do capital.

A monocultura canavieira no Nordeste determinou e determina os rumos do desenvolvimento econômico, bem como o atraso das questões sociais. A alta concentração de terras que permeia o Nordeste e o Brasil é um reflexo do processo histórico de expansão das monoculturas no Brasil, seja a da cana-de-açúcar, seja a do café e até a algodoeira, que se expandiu também no Nordeste e fortaleceu a indústria têxtil do mercado internacional e do próprio Centro-Sul do país.

Essa dinâmica produtiva do algodão não coloca o Nordeste em uma hegemonia econômica, pelo contrário, continua sendo o Centro-Sul o centro de desenvolvimento produtivo, bem como o responsável pela circulação de mercadorias, apropriação da mão-de-obra, circulação e aumento da produtividade do trabalho, uma vez que com o desenvolvimento da indústria no Centro-Sul o próprio Nordeste perde mão-de-obra para esta região.

O que se vê nesse processo é um crescente desenvolvimento desigual entre as regiões, onde o Centro-Sul passa a centralizar o desenvolvimento industrial, e o Nordeste com isso não consegue competir com a centralização de poder que se estabelece no Centro-Sul, com isso não se modernizando e perdendo espaço produtivo, tanto no mercado interno quanto no mercado externo.

A leitura de Chico, inicialmente amorosa pelo território Nordestino não se diferencia da minha, que acredita no potencial de uma região que é capaz de superar os processos de subordinação e ampliar a melhoria das condições sociais, econômicas e políticas, pois, o que falta mesmo é o interesse por parte da burguesia política, agrária, industrial que perpetua-se em condições de “senhores de terras” e massacra ainda muitos nordestinos e também muitos brasileiros que se submetem às relações de subordinação do capital .

O Nordeste de Chico, que é o meu Nordeste, é um Nordeste que se reinventa e luta por condições melhores de desenvolvimento territorial.  Por fim, o Nordeste tem potencial para se desenvolver sem submeter-se às relações de subordinação do capital, pois se os camponeses, trabalhadores assalariados, e todo o povo desta região se desenvolve também se expande esse desenvolvimento para o Brasil.

Estudar é tão revolucionário, que muitas vezes somos impedidos(as) de termos acesso a uma boa educação. É por isso que o @escrevenordeste quer incentivar vocês a conhecerem um pouco do legado de autoras e autores do Nordeste, para você se inspirar e ir além (Raqueline da S. Santos).

REFERÊNCIAS
CARVALHO, José Otamar de. Desenvolvimento regional: um problema político. 2. ed. – Campina Grande: EDUEPB, 2014.
CASTILHO, Eribelto Peres. Formação econômica do Brasil no pensamento de Francisco de Oliveira. 2008. 176 f. Dissertação (Mestrado em História) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2008.
MENDES, Flávio. Quarenta anos de uma elegia: Francisco de Oliveira e O Nordeste. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-49792018000300555.  Acesso em 21 de abril de 2020.
OLIVEIRA, Francisco de. Elegia para uma re(li)gião: SUDENE, Nordeste. Planejamento e conflito de classes. 3ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1981. 132 p. (Estudos sobre o Nordeste, v. 1)