Cerca de 150 militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e 50 policiais voluntários, simpáticos ao PT, reforçavam a proteção do ex-presidente Lula na chegada ao evento da noite da última quarta-feira (1º), em Porto Alegre, destino escolhido para sua primeira viagem ao lado da grande novidade petista para a eleição deste ano, o ex-tucano e agora alçado a candidato a vice, Geraldo Alckmin. A equipe da pré-campanha havia identificado ameaças de bolsonaristas nas redes sociais, mas nada que configurasse um perigo concreto, disseram aliados. A preocupação com a segurança do ex-presidente será uma tônica dessa corrida eleitoral para os petistas.
Mesmo no hotel em que Lula se hospedou para recepcionar apoiadores e pré-candidatos, um ambiente considerado controlado, ao menos 40 militantes entrelaçaram os braços para formar um cordão de isolamento no saguão e permitir que o ex-presidente se deslocasse sem tumulto da sala de conferências até o elevador. Hóspedes reclamaram: “Que esculhambação!”.
O estado da primeira viagem com Alckmin tem valor simbólico. O Rio Grande do Sul deu a Jair Bolsonaro 63,24% dos votos na eleição de 2018. Mesmo que tenha arrefecido, o apoio ao atual presidente entre os gaúchos e o clima de hostilidade política no país entraram no cálculo da pré-campanha para a segurança dos dois.
Em março de 2018, já condenado em segunda instância na Lava-Jato, o petista enfrentou protestos e até violência na Região Sul: foi alvo de manifestação e tumulto em Bagé (RS), teve sua caravana alvejada por tiros em Quedas do Iguaçu (PR), e se viu alvo de pedras e ovos em Chapecó (SC) e Nova Erechim (SC).
Hoje o cenário é diferente. O petista tem 47% de intenções de voto no Sul de acordo com o último Datafolha, contra 30% do atual presidente. Em relação à preferência pelo ex-presidente, a região perde apenas para o Nordeste, que marca 62% para Lula.
O entrave local
Se daquela vez Alckmin, então governador de São Paulo e pré-candidato à Presidência pelo PSDB, chegou a dizer que o petista havia “colhido o que plantou” após o atentado, o agora aliado foi envolto no esquema reforçado de segurança da comitiva — que contou com a contribuição espontânea da militância.
Além da segurança, a viagem tinha outra grande preocupação: a disputa entre PT e PSB por um palanque único da esquerda no estado.
Filho do histórico militante do MST Adão Pretto, o deputado estadual Edegar Pretto (PT) consolidou sua pré-candidatura ao Palácio Piratini enquanto o PSB fortalecia o projeto do ex-deputado federal Beto Albuquerque. Sem nenhum dos postulantes arredar o pé da eleição, agora as cúpulas petista e pessebista se veem obrigadas a desatar o nó.
Líderes do PSB não foram ao evento organizado pelo PT que reuniu integrantes de outros partidos da coalizão e movimentos sociais ligados à legenda, como PSOL, PCdoB, Rede e PV. Mário Bruck, presidente do PSB no Rio Grande do Sul, foi convidado e até chamado ao palco para discursar, mas não apareceu. Ele havia participado de uma reunião com o ex-presidente e outros dirigentes pela manhã.
Lula cobrou uma solução para os palanques em seu discurso no evento, que lotou uma casa de shows com capacidade para 5,5 mil pessoas:
“Quero fazer um apelo aos partidos que estão nos apoiando, que, por favor, sentem à mesa, tomem um aperitivo se quiserem, mas encontrem uma solução. Não custa nada sentar mais uma vez à mesa.”
Um comentário feito por Lula sobre ter sofrido para convencer Leonel Brizola (PDT) a apoiá-lo no segundo turno do pleito de 2002 foi entendido por Albuquerque como um aceno, afirmaram aliados.
Apesar do apelo, o ex-presidente terminou sua agenda em Porto Alegre na tarde da quinta-feira (2) sem ter se encontrado com o pré-candidato do PSB. A tarefa ficou a cargo de Alckmin, que tomou um café com Bruck e Albuquerque na manhã daquele dia.
“O apoio a Lula é geral. (Sobre o palanque estadual) Tivemos boas conversas”, Alckmin limitou-se a dizer ao GLOBO.
Historicamente apoiador do PT, Albuquerque se afastou do aliado a partir de 2014, quando disputou como vice de Marina Silva (Rede) a eleição presidencial e enfrentou uma pesada campanha de marketing petista. Desde então, a relação do gaúcho com Lula está estremecida.
Pró-Leite contra Onyx
Aliados, no entanto, consideram que o apoio do PT à pré-candidatura do PSB possa vigorar mediante um encaixe vinculado ao desfecho em São Paulo, de modo que Márcio França (PSB) retribua o gesto e retire sua candidatura em prol de Fernando Haddad (PT). Hoje o estado enfrenta impasse similar ao gaúcho.
Presidente do PT, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR) marcou um encontro com o presidente do PSB, Carlos Siqueira, na próxima terça-feira para tratar do assunto. Até lá, eles devem ouvir os dirigentes estaduais e tentar avançar na resolução.
No Rio Grande do Sul, lideranças consideram o risco de a militância de esquerda tender para o ex-governador tucano Eduardo Leite como o mais viável para derrotar o representante do bolsonarismo na eleição do estado, Onyx Lorenzoni (PL).